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Esperava-se que o arquiteto Oscar Niemeyer com as glórias e os poderes que alcançou, inclusive internacionalmente, viesse agora, contribuir e colaborar mais efetivamente no quadro atual em que se encontra a arquitetura brasileira, onde milhares de jovens profissionais abandonam o mercado de trabalho por falta de oportunidades.

Niemeyer, porém, fecha-se em torno de sua vaidade e rebate as críticas, como fez em carta publicada no Jornal do Brasil de 16/04/86, no Caderno B Especial, afirmando serem seus críticos “figuras menores marcadas pela frustração“, preferindo assim, “não discuti-las”. Parece-me que, na verdade, Niemeyer considera não dever prestar contas e ter com ele a certeza de que sua obra é indiscutível. O que desejam alguns de seus críticos, no entanto, não é o questionamento de sua obra e, sim, debater abertamente através dela o escândalo que é um único arquiteto absorver um número tão grande de obras públicas.

Sabe-se que a associação de Niemeyer com o poder vem de longe e traz, sem dúvida, uma herança de sucessos. Contudo, sabe-se também que tudo começou de forma mais justa quando, na década de trinta, em plena ditadura Vargas, o então Ministro da Educação e Cultura, Gustavo Capanema, arregimentou e selecionou, através de concurso público, uma equipe de jovens arquitetos, até então sem oportunidades, dentre eles Niemeyer. Esta equipe, comandada pelo espírito inovador do arquiteto suíço Le Corbusier, fez nascer, no Brasil, o primeiro marco representativo da arquitetura moderna brasileira, o prédio do Ministério da Educação e Cultura do Brasil, no Rio de Janeiro. Entretanto, o mais significativo é que, daí para frente, abriu-se um espaço que soube ser conquistado e fez de nossa arquitetura alvo de admiração mundial.

Não resta a menor dúvida de que, deste processo, quem se saiu melhor profissionalmente, o mais brilhante, foi Niemeyer; e isto é incontestável. No entanto, também é incontestável que o tempo passou e nossa sociedade tem procurado o caminho para novas transformações.

Acontece que percebo que nem os governantes e nem Niemeyer estão interessados na transformação. Ambos passaram a caminhar em função de suas vaidades. Os governantes partem do princípio que a escolha de Niemeyer para projetar suas obras será, certamente, o início do sucesso, será o esconderijo certo para as críticas incertas. Para o arquiteto, sem dúvida, será também a confirmação de mais um sucesso e a constatação de que Niemeyer foi, na história da humanidade, o homem que mais projetos realizou.

No caso, por exemplo, do nosso Estado do Rio de Janeiro, o Governador Leonel Brizola o escolheu para projetar e consagrar os principais marcos de sua obra governamental. Mas é preciso lembrar ao governador que as concorrências existem e que o aproveitamento de um homem com a experiência de Oscar Niemeyer pode e deve ser feito de maneira mais ampla e mais enriquecedora socialmente.

Cabe aqui lembrar, mais uma vez, a utilização de Le Corbusier. Hoje, Niemeyer ocupa, no quadro internacional, a mesma posição que naquela época o arquiteto suíço ocupava. Logo, sua utilização poderia se dar nos mesmos moldes em que se deu nos anos trinta, a de Le Corbusier.

As obras realizadas em nosso Estado, em meio a tanta desordem e insensibilidade, são inegavelmente belas, admiráveis, necessárias e, sem dúvida, permanecerão. Mas permanecerão sem as nossas marcas, frias e inquietas, como se alguma coisa, para nós, jovens profissionais, nelas faltassem.

João Latini